arte e haicai de Tchello d'Barros
uma gata preta
namora um gato branco
numa tarde cinza


POETRIX



Paradoxo

Todos os dias o amanhecer intima a viver
A correria do dia a dia me enterra viva. 
 - até ao anoitecer

Poesia Na morada


Na morada


Na minha casa não tem compartimento secreto
nem lugar proibido.
Minha casa é um livro aberto,
com meus amigos divido.

Na minha casa tudo combina com o clima e o astral.
O chinelo havaiana nunca reclama de morar debaixo da cama
com um velho sapato social.

As fotos dos filhos estão por toda parte
Exibo sim, são minhas obras de arte.

Uma erva daninha nasceu na floreira
cresceu trepadeira, não posso arrancar.
Um pé de gerânio abriu a cortina
e na surdina deixou o sol entrar.

Os livros povoam a sala, banheiro, armários,
gavetas e estantes.
São meus companheiros, eternos amantes.
Nunca vão me abandonar.

Lá em casa tem creme pra cabelo seco,
molhado, pixaco, loiro, ruivo e preto.
Tem óleo, toalha e escova de dente.
Vá que alguém de repente precise pernoitar.

Na parede tem um desenho de lápis de cor
sobre papel almaço.
Tem muito mais valor
do que a obra de Picasso.

Na cristaleira não tem cristal
Mas tem cachaça, tequila, mescal
Um vinho barato, licor de pequi
E uma última dose de bacardi.

Tenho tudo que preciso no meu Cinema Paradiso:
Poderoso Chefão, Telma e Louize,
Tomates verdes e fritos, Café Badgá
e assim, La nave vá.

Grafitrix Al dente


Tem um banco novo na praça

Se chama "BANCO DA POESIA". O banqueiro e maior investidor é o competente Cleto de Assis, que com seus desenhos mágicos transforma palavras em imagens belíssimas.
O endereço do banco é http://cdeassis.wordpress.com
Eu já abri uma conta e depositei meus trocadilhos. Em menos de 24 horas, rendeu a formatação do poetrix acima e a ilustração abaixo, que acompanha minha biografia. Valeu, grande CLETO!


Eu sou só uma mulher que sofre de poesia crônica

eu sou só uma mulher que sofre de poesia
eu sou só uma mulher que sofre
eu sou só uma mulher
eu sou só uma
eu sou só
eu sou
eu

Mandado de busca e apreensão contra a poesia


Mandado de busca
e apreensão contra a Poesia


Senhores, minha poesia sumiu.
Botem os cães nos seus calcanhares.
Farejem tudo: becos, sótãos, rios.
Vasculhem céus, terras e mares.

Procurem nos dedos dos músicos,
no negro quadro de cada escola,
no fascínio quântico dos físicos,
na placa do cego que esmola.

Busquem nos diários e discos rígidos;
nos papiros, nas lápides dos túmulos;
nas paredes dos banheiros públicos;
nas gavetas e nos grafites dos muros.

Investiguem as pedras das cavernas;
os evangelhos apócrifos e as escrituras;
os templos, os conventos e as tabernas;
as democracias e as ditaduras.

Vejam nas celas e nos parreirais;
nos campos de girassóis maduros;
nos poetrix, epigramas e haicais;
no passado, no presente e no futuro.

Pesquisem nos álbuns de fotografias,
nos bares, museus, sebos e alcorões.
Se não encontrarem, revirem as livrarias,
costumam prendê-la nos porões.



E que isso não se repita!



Queres comprar meus olhos?
Não, não estão à venda.
Se te ensinassem a ver
te emprestaria.

Uma fresta bastaria
para eu encontrar o sol.

Me conheço de escuros,
de muros,
quinas,
esquinas e encruzilhadas.

Vais me amordaçar para que eu emudeça?
Esqueça!

Eu falo pelos cotovelos,
pelos pêlos,
pela saliva,
pelos olhos,
pela poesia.

Vais vendar meus olhos para que eu te siga?
Pois venda-os!

Venda tua alma ao diabo se quiseres!

Eu me nego!
Nem cega,
nem muda,
nem morta,
me entrego!

Grafitrix Usufruto

Poesia Sobre nós e elos

Sobre nós e elos

Acontece,
que somos elos de uma corrente
feita por um desses deuses dementes
que se divertem com a desgraça da gente.

Acontece,
que estamos sempre a procura
de uma corrente segura
pra nos encaixar.

Mas, acontece
que essa maldita corrente
sempre arrebenta no mesmo lugar.

Acontece,
que existem elos perdidos
que vieram ao mudo
só para serem partidos.
Elos órfãos,
que vivem sós,
que se amam,
mas não se atam,
como nós.

As vezes me pego sonhando
com um universo paralelo,
cheínho de elos,
todos sem par.
Quem sabe é por lá
que nossos chinelos
vão se encontrar

Lua e dragão




Sabe aquela lua âmbar que apareceu ontem à noite?
Deu uma vontade louca de seguir a estrada que ela abriu no mar só pra ver onde vai dar.
Os homens são apaixonados pela lua.
Eu não.
Eu fui apaixonada por São Jorge.
Quando menina, eu queria casar com ele.
Mas daí, o tempo foi passando, fui esquecendo de rezar, fui gostando do pecado e acabei esquecendo do santo.
Agora quero casar com o Dragão. Descobri que dragões são figuras bem interessantes. Muito mais interessantes que os santos homens.
Ontem a noite, quando o Dragão apareceu dentro da lua âmbar, prometi que iria salvá-lo da espada de São Jorge.
Mas... e se o Dragão também estiver apaixonado pela lua como todos os homens que amei?
Mato aquela cadela!